Técnico do júnior fala de sua carreira, das revelações e do sucesso das Div. de Base , do relacionamento com Evaristo e das chances do Bahia na Copa SP.
A paixão da família de Marcelo Chamusca pelo futebol é marcante. Sua avó, de tão fanática, foi enterrada com a bandeira do Bahia sob o caixão. Seu avô não perdia um jogo do tricolor e foi influência para que os netos, Marcelo e Péricles (hoje também técnico), além de loucos pelo esporte, fossem torcedores do Bahia na infância.
Nada mais natural do que Marcelo Chamusca, então, escolher uma profissão ligada à maior paixão nacional para sobreviver. Resolveu ser jogador, um volante. Começou a carreira no Bahia, nas Div. de Base, em 1979, e ficou lá até 1988. Nesses quase 10 anos, foi Bi- Campeão Baiano de juniores (85-86) e Bi- Campeão Baiano de profissionais.
Passou ainda pelo Galícia, Treze/PB e Colatina/ES, onde resolveu encerrar a carreira, pois começou a rodar demais por clubes de médio e pequeno porte após sua saída do Bahia. Há algum tempo já vinha pensando em ser técnico, influenciado pelo irmão Péricles, quando resolveu aceitar o convite do então Superintendente das Divisões de Base do Vitória da Bahia, Newton Mota, em 1993. “Ele disse que eu seria um bom técnico pela minha personalidade e liderança, como jogador”.
Chamusca não pensou duas vezes, pediu recisão contratual ao Colatina, e assumiu o cargo após a conclusão de um estágio de treinador.
Ficou como técnico do juvenil do rubro-negro até 1998, chegando até a assumir o time júnior interinamente algumas vezes. Foi pentacampeão estadual e conquistou dois títulos internacionais. Ainda como treinador do Vitória da Bahia, fez um estágio de dois meses no PSV da Holanda, em 1996, onde aperfeiçoou e aprofundou seus conhecimentos sobre tática futebolística.
A competência demonstrada nos cinco anos do início de seu trabalho levaram Chamusca a receber proposta para coordenar as Div. de Base do Sport/PE, em 1998. Na função, levou a equipe pernambucana ao tri-campeonato estadual de juniores e à conquista inédita do Torneio de Chenoise, na Suíça, um dos títulos mais importantes do mundo na categoria júnior.
Em fevereiro de 2000, foi a vez do Bahia se interessar por Marcelo Chamusca. O então recém chegado coordenador das Div. de Base do clube, o ídolo Bobô considerou Chamusca peça fundamental no projeto de reestruturação do setor e o chamou para chefiar a comissão técnica do time júnior.
Tricolor desde criancinha, Chamusca começou a trabalhar no Bahia em fevereiro daquele ano. De lá pra cá, já deu à galeria do clube cinco troféus. Em 2000, foi Campeão da Taça Estado da Bahia, segundo torneio de profissionais mais importante a nível estadual, mas que o Bahia joga com a equipe júnior, por estar disputando o Brasileirão. Conquistou também a Taça Verão, em Maceió.
Em 2001, Chamusca levou o tricolor a quebrar a hegemonia de seu arqui-rival e conquistar o Campeonato Baiano. Mas o sucesso não se limitou às fronteiras do nosso estado. Em novembro, o Bahia levantou a taça do I Copa Nordeste da categoria, derrotando, na final, o Sport, em Recife, com dois jogadores a menos.
Mas o título mais importante de Chamusca no Bahia talvez tenha sido o do Torneio Internacional de Marseille, na França, em 2001, onde o tricolor desbancou tradicionais equipes européias, como Bayern/ALE e Olympic/FRA, e voltou a figurar de forma triunfante no cenário mundial.
Nesta entrevista exclusiva ao Site Oficial do Bahia, Marcelo Chamusca faz um balanço do ano de 2001 para as Div. de Base, fala de sua carreira e dos planos para 2002, quando logo em janeiro disputa a Copa São Paulo, competição mais importante da categoria júnior no Brasil.
2001
Foi um ano excelente para nós. Conquistamos três títulos graças a um planejamento feito no início do ano e seguido à risca. No primeiro semestre, nos programamos para a disputa do Baiano e do Torneio da França, conseguimos os dois. No segundo semestre, nossa meta era usar a Taça Estado como laboratório e preparar a equipe para a Copa SP. Mas aí acabou aparecendo a Copa Nordeste, que não estava prevista no calendário. Então resolvemos priorizar essa competição. Passamos a poupar nossos principais jogadores da Taça Estado, já que jogaríamos seis jogos em uma semana no Nordestão. Apesar de todo o lobby para que o Sport/PE, jogando em casa, fosse campeão, vencemos na final, jogando com dois a menos.
O técnico Marcelo Chamusca
Sou uma pessoa que vivenciou muitas coisas no mundo do futebol e procurou aprender com as mais diversas situações. Por outro lado, cursei Ed. Física durante algum tempo, fiz estágios na Europa, o que me deu um embasamento teórico. Como treinador procuro juntar os conhecimentos teóricos aos práticos. Uso uma linguagem mais acadêmica com os atletas, mas busco sempre estar perto deles no trabalho, saber um pouco mais de suas vidas para que isso não interfira no rendimento profissional. Ás vezes um garoto não vem apresentando o esperado por problemas extra-campo, de ordem psicológica. Por isso, é preciso conhecê-lo, conversar com ele para, se for o caso, encaminhá-lo a cuidados de profissionais especializados da equipe multidisciplinar do clube.
Copa São Paulo 2002
Vai ser uma competição dificílima. Primeiro porque este ano apenas um time por grupo se classifica. Segundo porque perdemos quatro dos nossos melhores jogadores (o atacante Kena e o lateral Daniel, revelações do Bahia no Brasileirão 2001, além do volante Jair, subiram para o profissional e não foram liberados para o certame. O meia-atacante Uéslei sofreu uma artroscopia no joelho e também está fora). Esses desfalques vão fazer muita falta, pois já estavam totalmente entrosados com o resto do grupo. Vai ser mais difícil ainda sem eles, mas contamos com um grupo forte e qualificado. Nossa classificação vai depender do momento da equipe.
Adversários na Copa SP
O Santos tem uma ótima equipe, formada por jogadores experientes, alguns até atuaram neste último Campeonato Brasileiro. Eles fizeram grande campanha no último Paulista. O nosso primeiro jogo é contra eles e vai decidir o futuro do Bahia na competição; Com o América/RN, todo o cuidado é pouco, pois foi responsável por nossa única derrota na Copa do Nordeste. Eles jogam ofensivamente e têm um contra-ataque muito perigoso; Conheço o treinador do Paulistano e eles não virão com um time fraco, principalmente por jogarem ao lado de sua torcida.
Razões do sucesso das Div. de Base
O Bahia começou a crescer nas Divisões de Base quando passou a adotar uma estrutura multidisciplinar no setor. Hoje, a Div. de Base não se resume à Comissão Técnica. Os garotos recebem o apoio de nutricionistas, pedagogos, psicólogos e assistentes sociais. Isso os deixa mais seguros e dispostos. Outra coisa que ajudou foi o estabelecimento de sete categorias. O garoto pode entrar no clube com 10 anos, recebe um acompanhamento anual até chegar aos profissionais. Há a criação de uma identidade e o clube passa a conhecer totalmente o atleta. Um fator fundamental também foi o aumento de participação nas competições, o que vai acostumando os atletas a elas e dá mais confiança e personalidade aos jogadores.
Daniel e Kena
O Daniel é um jogador técnico, ataca e defende muito bem e tem muita personalidade. Com a carência de laterais-direitos no nosso futebol, e com a idade dele (19 anos), acho que é candidato a uma vaga na Seleção Brasileira de Juniores. Kena é o que se chama de jogador-espetáculo, gosta de dar show para torcida, é driblador, ousado. Acredito que essa dupla ainda vai dar muitas alegrias ao torcedor do Bahia.
Bobô
O fato de termos alguém como Bobô à frente das Div. de Base é altamente positivo. Ele é bastante competente, tem um espírito de liderança nato, está sempre disposto a atender nossas reivindicações, além de servir como exemplo para os atletas.
Pressão por resultados
Em Divisão de Base há o pensamento de que o objetivo é formar jogadores, o que é uma meia verdade. Acho que a cobrança excessiva pelas vitórias é extremamente negativa, pois o mais importante nas categorias inferiores é trabalhar a qualidade técnica e individual de cada jogador. No júnior é até aceitável, pela proximidade dos profissionais, mas nas outras categorias não. É claro que existe e sempre vai existir a pressão por bons resultados. Procuro encarar isso de forma natural, tentando deixar os meus atletas sempre preparados para situações de cobrança, conversando com eles no dia-a-dia.
Relação com Evaristo de Macedo
Nosso relacionamento é o melhor possível. Estamos sempre conversando. Quando há a necessidade de que um jogador júnior substitua um profissional, o Evaristo sempre pede a minha opinião. Foi assim com o Daniel. Surgiu a urgência, ele falou comigo e eu disse que o jogador estava preparado.
Futuro
O meu objetivo é ser técnico de profissionais. Estou trabalhando e me reciclando sempre para isso, para que, quando a oportunidade aparecer, possa agarrá-la. Isto porque, para mim, “sucesso é competência quando a competência se encontra com a oportunidade”.