Leia, na íntegra, o discurso que o presidente Marcelo Guimarães faria nesta sexta-feira, ao passar o cargo para o novo presidente, se houvesse eleição.
Meus amigos Tricolores. Senhores membros do Conselho Deliberativo, ex-presidentes, grandes beneméritos do nosso querido Esporte Clube Bahia.
Acho que o imortal escritor Euclides da Cunha, vivenciou um momento semelhante ao que estou vivendo agora, quando escreveu Os Sertões, e conseguiu resumir numa frase antológica, que o nordestino, é antes de tudo um forte.
É exatamente como me sinto agora. Como um Nordestino. Sofrido, maltratado, magoado pelas intempéries da vida, mas jamais entregue, vencido, derrotado, sempre um eterno lutador, um homem que não se entrega e caminha de cabeça erguida.
Sou um vencedor. Ao longo da minha vida, iniciada no meu querido Bairro da Ribeira, sempre me dividi entre o trabalho e a prática do esporte. E venci nos dois, com tal força e determinação, que consegui vitórias espontâneas na formação de uma grande família, como filho, irmão, marido, pai e avô, e na conquista de verdadeiros e leais amigos.
Como desportista ganhei tudo o que enfrentei pela frente. Fui atleta, e um dos maiores dirigentes da história do remo na Bahia, 14 vezes, consecutivas, campeão baiano de 73 a 1986. Duas vezes interventor, e uma vez presidente, da Federação Baiana de Remo, além de um bom e eficiente jogador de futsal, nos meus tempos do Exército e no Clube de Regatas Itapagipe.
Como dirigente, transformei o Clube de Regatas Itapagipe num exemplo de clube social. Sólido patrimonialmente, forte socialmente, e um grande campeão nos esportes: remo, basquete, vôlei, futsal, o que vinha pela frente, nós ganhávamos, atravessando fronteiras.
Como político, comecei minha carreira em 1990, como Deputado Estadual eleito pelo PRN, com quase 9 mil votos. Fui eleito por mais dois mandatos, pelo PL Partido Liberal, em 94 com 30 mil, e em 98, com 57 mil votos. Entrei no Bahia cumprindo meu segundo mandato, eleito para o terceiro, como Deputado Estadual, sempre com uma votação crescente.
Mas, desde os primeiros momentos da minha vida, em tudo o que fazia, jamais dividi a minha paixão pelo ESPORTE CLUBE BAHIA. Cresci amando as cores do meu querido Tricolor, participando da sua vida como torcedor, conselheiro, até que em 1997 fui efetivamente convocado para dirigir os rumos do Bahia como seu presidente.
Não posso resumir meus oito anos de administração na presidência do Bahia, sem voltar um pouco ao passado, na condição em que recebi o clube, e como hoje, oito anos depois, entrego ao meu sucessor.
Assumi a presidência do Esporte Clube Bahia com o time na Segunda Divisão do Campeonato Brasileiro, com uma dívida de 14 milhões de dólares; com 137 cheques sem fundos espalhados pelo País; 103 Notas Promissórias vencidas; devendo a 98 fornecedores e prestadores de serviço; com 189 ações trabalhistas; um clube que teve, por oito meses, suas arrecadações penhoradas pela justiça, tinha apenas três jogadores profissionais; o Vitória tinha conquistado o tricampeonato baiano, a Divisão de Base do Bahia devastada, com o Vitória comemorando um hexacampeonato de juniores; não tinha crédito no mercado, com fama de mal pagador, não conseguia contratar porque os jogadores nunca recebiam o acertado, até mesmo depois da rescisão contratual.
O Esporte Clube Bahia meus caros amigos e conselheiros, custa hoje mais de R$ 1 milhão de reais por mês. Atrás do time de futebol, existe uma estrutura que emprega 200 funcionários, a construção de um Hotel dentro do CT do Fazendão que abriga mais de 120 garotos das Divisões de Base, com até seis refeições por dia, no Complexo Osório Villas Boas, na Rua Lourival dos Santos, o Alemão, que foi literalmente reconstruído, não tinha sequer muro de proteção, e hoje é um dos melhores Centros de Futebol do Brasil.
O Fazendão teve seus campos reformados e ampliados, inclusive com a construção do Parque Esportivo Paulo Maracajá, com arquibancadas para 3.500 torcedores, proporcionando ao Bahia, a condição de poder disputar em casa os campeonatos de infantil e juvenil, pela primeira vez nos seus 74 anos de fundação, num investimento de R$ 8 milhões de reais.
Estou entregando hoje ao meu sucessor, a presidência de um clube, não de um time de futebol, de várzea, como recebi em 97. Um Esporte Clube Bahia patrimonialmente fortalecido, administrativamente organizado, e socialmente recuperado, com uma sede, esta aqui, na Boca do Rio, que até 1997 abrigava marginais e desocupados, que foi totalmente revitalizada, com piscina olímpica, campo de grama sintética, lanchonete, restaurante panorâmico e uma parceria que viabilizou a Espetáculo, a melhor casa de shows da Bahia, o point de Salvador, custeando despesas de água, energia, impostos e salários de uma sede que a imprensa identificavam como Elefante Branco.
Particularmente no futebol, sob a minha administração o Bahia voltou à Primeira Divisão do Brasileiro em 2000, onde ficou até 2003. Conquistamos com títulos como o bicampeonato baiano de 98/99, o campeonato de 2001, o bicampeonato do Nordeste em 2001/2002, a Copa Maria Quitéria, contra Vitória, Flamengo e Corinthians, que equivalem à conquista de um título por ano de administração, computando-se ainda o tricampeonato de juniores, o bicampeonato do Torneio de Marselha, na França, à volta dos garotos revelados nas Divisões de Base às convocações da Seleção Brasileira (Ernane, Jair, Neto Potiguar, Paulo Cerqueira, Denílson, Ávine, Cleberson, entre muitos outros), sendo que ainda pelo Bahia, Daniel foi campeão mundial sub-20, e Ernane 3º no Mundial sub-20 deste ano, ajudando no soerguimento da imagem profissional do Bahia, inclusive internacionalmente, com o empréstimo de nove jogadores a clubes da Europa, Ásia e América Central, (Ari, Neto Potiguar, Marcel e Jorginho, no Japão, Marcelo Nicácio na Grécia; Nonato na Coréia, Robson no México, Elias na Eslovênia, e William em Portugal, abrindo um mercado que não era explorado pelo Tricolor.
Mas é claro que errei, tive meus erros ao longo destes oito anos à frente da presidência do Esporte Clube Bahia. No futebol, errei a partir de 2003, quando deixamos de ganhar, voltamos para a Série B do Campeonato Brasileiro, e passamos por dificuldades e derrotas que uma torcida fiel como a do Bahia, uma Nação com um universo de cinco milhões de fanáticos torcedores, não merece, não aceita.
Não vou transferir responsabilidades. Como presidente, sou o responsável por tudo o que aconteceu de bom e de ruim com o meu querido Esporte Clube Bahia durante os oito anos da minha gestão. Ao contrário, só quero aqui agradecer a todos, indistintamente, sem citar nomes, porque fatalmente cometeria injustiça. Meu muito obrigado, desde os mais próximos, vices-presidente e diretores, até o anônimo funcionário da administração, que sempre estiveram ao meu lado neste período, e a minha querida e fanática torcida Tricolor.
Parei, refleti, ouvi conselhos, consultei minha família, amigos, e achei que esse é o momento de dar espaço, oportunidade a novas idéias. No livro A Arte da Guerra, para executivos, os ensinamentos do General chinês Sun Tzu continuam a ser atual. Ministrados nas escolas de negócios de todo o mundo, são seguidos à letra pelos líderes de grandes empresas, aplicados em todas as áreas no mundo dos negócios. E num dos seus ensinamentos, diz: a situação no campo de batalha é que determina quando é aconselhável avançar ou recuar. Numa situação de fragilidade, evite a luta.
O torcedor é fiel e sempre tem razão. Eu entendo sua angústia, porque muito antes de ser presidente, sempre fui um fanático torcedor, um grande tricolor, e estou sofrendo com os maus resultados do time na Série B do Campeonato Brasileiro.
Não estou deixando o Bahia. Não sou covarde, não abandonaria meu clube, ainda mais dentro do atual momento em que atravessa. Cumpri rigorosamente o meu mandato até o último minuto, que termina agora, com a eleição do meu sucessor, do novo presidente que vai gerir os destinos do Esporte Clube Bahia pelos próximos três anos, inclusive com a missão de adequar seus Estatutos dentro da Reforma determinada pela Lei Pelé, com prazo até o primeiro trimestre de 2006, para que em 2008, a eleição presidencial do Tricolor seja através da Assembléia Geral, formada pelos sócios, com o mínimo de um ano de contribuição social.
Terminou meu mandato mas estarei ao lado do novo presidente, porque não poderia, depois de todo o trabalho que tivemos para sua reconstrução, entregar o clube a um aventureiro qualquer. Na condição de conselheiro, vou continuar a ajudar, inclusive na concretização de metas e projetos, como a ampliação da sede do Fazendão, e a compra das ações do Bahia junto ao Grupo Opptunity, enfim, o Bahia é e sempre será um pedaço de mim, e por isso não estou aqui dizendo adeus, apenas um até logo.
Muito obrigado……..